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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

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Eu, sombria e cinzenta, perseguia-me durante a caminhada nevoenta. Preocupei-me apenas em fugir de mim. Percebi, deveras tarde demais, que entregar-me a ti e provar do amor seria a redenção de minh'alma. 

Me and Myself


Mergulhou em si,
Moveu-se.
Encontrou a si,
Perdeu-se.
Abriu sua caixa
Revelou seus segredos
Provou do veneno
Tingiu-se de cinza
Faleceu ali.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

To Build a Home


No céu, um manto de nuvens negras anunciavam a proximidade de chuva forte. Eu rumava sem destino pelas ruas desertas, a neblina habitando cada canto dali, imersa nos meus próprios pensamentos. Sonhei acordada com a proximidade dela. Um ser quase intocável. Buscava arrancar sem resultados tudo que me habitava. 

Tentei inutilmente minar os meus defeitos na ânsia de acertar e ali estava eu, cometendo incontáveis erros e me punindo por eles. Novamente. De novo. Contemplei as cicatrizes que existiam em meu braço e desejei que todas elas desaparecessem junto com toda aquela névoa fria. Acariciei o novo corte feito, antes da minha fuga, e o vi gotejar no meu cardigã branco. Uma mancha vermelha surgira ali.

Meus pés rumaram para o café mais próximo. Aquele tão conhecido por mim. Com os joelhos quase cedendo, subi a estreita escadaria e sentei numa mesa no canto do ambiente. Lisa me avistou ao longe e caminhou até mim cautelosamente, o caderninho de pedidos em mãos. Ao parar ao meu lado, senti os seus olhos se arrastarem sobre mim e pararam na mancha de sangue em meu cardigã.

- Ahn... O que vai querer? - Deixou escapar com a voz fraca.

- Só um café! - Respondi fitando a rua lá embaixo ser engolida pelos primeiros pingos de chuva. 

- Você... está bem? - Ela me perguntou, fazendo menção de tocar meu casaco manchado. Afastei meu braço das mãos dela e a fitei intensamente.

- Eu só quero o meu café, Lisa - falei acidamente - não vim aqui pra falar com você, se é isso que está pensando!

- Eu não pensei em nada! - Ela falou. Senti que estava a ponto de chorar. Meu coração pulsou intensamente e um nó foi atado em minha garganta. Deixei que as palavras me escapassem antes que eu pensasse duas vezes em pronunciá-las.

- Ótimo! Então não seria um problema pra você me conseguir um café, sim? - Voltei a encarar a rua. Lisa deu meia volta e foi até o balcão com o pedido anotado. Mergulhei em minhas próprias lembranças enquanto a chuva aumentava, arrependendo-me no segundo seguinte.

- LISA! POR FAVOR! ABRE ESSA PORTA! - Eu gritava para a porta fechada do apartamento dela. Vários vizinhos já colocavam as cabeças para o lado de fora a fim de olhar o ocorrido.

- VAI EMBORA! JÁ FALEI O QUE TINHA PRA FALAR COM VOCÊ! - Escutei a voz agressiva dela gritar do lado de dentro do apartamento,

- Ele não te ama como eu amo, Lisa! Eu quero estar com você, acordar ao seu lado, dormir do seu lado. Por favor, eu te imploro, não faz isso comigo! - Ajoelhei no meio do corredor, sentindo meu corpo estremecer e as lágrimas escorrerem pela minha face e descansarem em meus lábios. O tempo chuvoso havia encharcado minhas roupas durante minha ida até ali.

Lisa abriu a porta e fitou meu corpo ajoelhado em frente a sua porta. Os cabelos ruivos estavam presos num  coque perfeito. Vestia calça moletom e blusa de manga.

- Eu o amo, Effy! E nada mais importa. Portanto, levanta daí e volta pra casa. E leva a droga do seu amor com você! Eu não o quero! - Ela falou me encarando. Seu olhar queimava. Suas palavras me feriam. 

- Você... você... disse que me amava! - As palavras eram ditas com dificuldade. Meu coração parecia ter parado de bater.

- Eu menti. - Ela disse, fechando a porta em seguida. Escutei a chave girar e os passos dela se distanciarem.

- NÃO! NÃO! LISA! LISA! POR FAVOR! - Esmurrei a porta. Todos no sétimo andar me observavam.

- Seu café! - Me assustei com aquele sussurrar repentino. A voz de Lisa me arrastou de volta para a realidade. De volta para o ambiente com mesinhas e cortinas quadriculadas. Ainda chovia. 

- Obrigada! - Respondi secamente, puxando o café para mais perto e tomando um gole. Senti a bebida quente me aquecer por dentro. Lisa exitou durante alguns segundos e sentou na cadeira defronte mim. Levantei os olhos e vi que ela me olhava com expectativa. 

- O que foi isso no seu braço? - Ela perguntou.

- Não é da sua conta! - Respondi.

- Queria conversar com você! - Sua voz falhou.

- Não é do meu interesse. - Bebi o resto do conteúdo rapidamente. Tirei do bolso uma nota de dois reais, depositei sobre a mesa e me levantei. Lisa levantou também e tentou segurar meu braço. Me distanciei e desci as escadas. Os pingos de chuva tocaram meu corpo. Pensei em voltar pra casa e me dei conta que não faria diferença. Meu coração continuaria doendo e a imagem de Lisa me perseguiria aonde quer que eu estivesse.