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domingo, 25 de dezembro de 2011

Strong?




Ela acordou sentindo o cheiro dela, mesmo tendo ciência de que a garota que acabara de aparecer em seus sonhos declarando-se apaixonada não estava ao seu lado, tampouco pronunciara tais palavras.

Desistira de entender o porquê da presença dela em todos os seus sonhos obscuros. Incomodava o fato de ela se fazer presente em todas as circunstâncias de sua vida medíocre. Quando começou a relatar tal história, prometeu a si mesma que seria a ultima vez que escreveria com a imagem dela rodopiando em sua memória.

Nos ultimos dias, parei para observa-la. O coração continuava obscuro. O olhar ainda era vago, mas algo em seu interior mudara. Fora possuída por uma frieza que acumulou durante os meses de recuperação e de medicação controlada. Fez-se livre, mesmo tendo sua alma aprisionada. Ela não se tornou feliz (a felicidade é uma grande mentira para ela), tampouco permaneceu triste. Apenas preferiu manter-se distante de si apenas para não ter de se encontrar.

Sabe aquele cansaço que tanto relatei nos últimos meses? Foi ele que a motivou. Motivo-a a esquecer de procurar as respostas e apenas a viver. Aprendeu ela com as dores que até hoje não foi capaz de mandar embora porque sente que é aquilo que a mantém viva. Que amor incondicional é lindo, mas que não deve ser entregue a qualquer um. Que depois de todos os pesares, ninguém merece tal coisa de sua parte. Hoje, ela só ama a si e a sua família. O resto... é apenas resto.

Sobre a figura de seus sonhos, ela prefere não tecer mais comentários. Sente que, mesmo tendo as lembranças ainda aprisionadas em seu intimo e sabendo que nunca se livrará delas, elas as conserva. Talvez ainda precise das lembranças que a tornam fraca para se fazer mais forte.

sábado, 17 de dezembro de 2011

De: Bruna Para: Bruna



Querida Bruna,

Eu sei, é cansativo ter de contar as horas, os dias, os meses e se perguntar o porque de ainda estar viva. Mais cansativo ainda é perder minutos, segundos, milésimos de segundos questionando quem é você ou tentando encontrar quem você é. Durante muito tempo, as palavras foram a força vital que me levou a seguir em frente. Com elas, tentei traduzir o que se passava em meu intimo, mas disso eu cansei também.

Confesso que posso comentar dizendo que tenho o péssimo habito de guardar coisas do passado. Cartas, cartões, bilhetes, camisas e o que mais você imaginar. Quando era criança, com toda a inocência daqueles que ainda são capazes de contar a idade nos dedos, pensava que no futuro ia me contentar em relembrar fatos e pessoas que passaram pela minha vida. Hoje, eu me vejo querendo queimar tudo que remete a lembranças na qual desejo esquecer. Talvez, possa eu dizer, deseje aniquilar todo o meu passado só para não ter que contemplar o que me tornei.

Nunca fui de ter muitos amigos. Nunca fui a primeira a ser notada, a ultima a dar a palavra nem a inesquecivel na vida de ninguém. No fundo, acho que sempre fui aprisionada em mim mesma e gostava de manter-me ali. Até hoje, conservo uma caracteristica que não quero perder. Aquela que me conserva a uma distância segura do mundo ao meu redor. Odeio quem ultrapassa a linha que separa meus sentimentos, ou dos que conseguem decifrar o que se passa em meu intimo. Quando isso acontece, eu fujo.

Muitas pessoas costumam confundir sensibilidade com romantismo. Sim, sou muito sensível. Até mais do que eu gostaria ser (Só para eu não precisar comentar que odeio ser sensível!), mas estou longe de ser romântica. Não consigo dizer 'Eu te amo' para quem realmente amo. Não sou atenciosa - mesmo morrendo de saudades, dificilmente irei ligar - mas quase sempre estou disponível para conversar, sobre qualquer assunto a qualquer hora do dia (ou da noite!).

Uma vez me perguntaram que cor eu seria. Respondi que seria roxo. Em seguida, me perguntaram que cor eu era naquele exato momento. Sem dúvidas, sou cinza. Uma cor totalmente indecisa. Ela não é misteriosa como o preto, muito menos iluminada como branco. Sou cinza como fumaça de incêndio. Como nuvem de chuva. Sou cinza como a indecisão. Como a tristeza.

Esqueci de comentar. Pra falar a verdade, essa é uma das coisas que eu odeio comentar. Já tenho um repertório de caracteristicas dadas pelos alheios ao que se passa em mim. Dramática, Insegura, Fraca (esse é o mais odiado!). Como não gosto de debater sobre isso (na verdade, não gosto de debater sobre nada), deixo as nomeiações e os predicados dados por aqueles que não entendem esquecidos em meu intimo. Se eu gosto de ouvir essas coisas? Lógico que não! Você gostaria? Acabei aprendendo com isso que certas coisas não devem ser debatidas, escritas, narradas ou contadas. Fiz do silêncio a minha força e deixei toda a angústia/solidão/dor que me possui em completo anonimato, mas você pode encontrá-la tatuada em minha pele ou emanando do meu olhar.

Meus ultimos sonhos foram recheados de tormenta. Acho que sempre foi assim, mas só agora comecei a me dar conta disso. Toda noite, ao fechar os olhos, sou possuída por visões tristes, fugas e medo. E aquela única presença que insiste em permanecer ao redor. Tento me convencer até hoje que a melhor coisa que me aconteceu foi a ausência repentina dela. Desejo apenas parar de ser assombrada pelas lembranças que ela me deixou. Acenei e deixei-a partir sabendo que o nó atado em minha garganta demoraria a afrouxar.

Lembra daquele cansaço que falei no início? Pois bem, estou cansada. Cansada de olhar para meu próprio reflexo e não saber direito para quem estou olhando. Cansada de ter meu coração pisoteado ou fazer da minha vida uma canção de Fresno. Mudar seria um erro? Ultimamente, tenho achado que não. Desejo então mudar. Desjo me encontrar. Desejo que você também se encontre. Talvez, se você se encontrar, o mesmo aconteça comigo.

Com carinho, Bruna.

domingo, 11 de dezembro de 2011


O despontar dos raios solares acordou-a do sono que durara apenas algumas horas. A brisa fria adentrava pela janela que ela esquecera de fechar antes de dormir. Sobre o peito magro, jazia o livro que a pusera pra dormir. Desvanecia-se a garota em suas páginas empoeiradas em busca da companhia de amigos invisíveis que fazia em cada capítulo lido. Em seus sonhos, os encontravam e deleitavam-se em longas conversas como se fossem amigos de longas datas.

Levantou-se contra a própria vontade e fitou suas feições no espelho gasto pelos longos anos de existência. As olheiras habitavam sua face e a palidez piorara depois de dias com a falta de fome. O olhar cinzento, olhos de névoa, eram tão vagos quanto os pensamentos que lhe habitavam. O silêncio da casa gritava em seus ouvidos e o quarto cheirava a mais pura solidão daqueles que preferem isolar-se do mundo.

A porta do quarto rangeu ao ser aberta e os pés descalços dela levaram-na em direção ao salão de entrada de sua morada gigantesca. O lustre de cristal deixava a casa mais fúnebre do que já aparentava ser. Contemplou ela todos os retratos de antigos parentes que já deixaram o mundo, mas que conservavam um pedaço de suas almas nas pinturas penduradas na parede de pedra. De certa maneira, eles lhe faziam companhia quando a sua já não era mais bem vinda.

Seus olhos captaram a brumas da madrugada pelas grandes janelas do salão e ao abrir a grande porta de carvalho que havia na entrada, sentiu aquela névoa acariciar lhe o corpo. Distinguiu o cheiro de pinho que vinha da floresta próxima e foi atingida pelo sopro de angústia que perpassou em seu intimo. Ainda lhe restava esperança no peito, mas a certeza já era suficientemente grande para que ela se convencesse que perderia a vida ali, imersa na solidez da ausência de alguém para compartilhar sua tristeza.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Cansada de escrever autobiografias dos meus sentimentos.
Cansada de ser julgada.
Cansada, apenas.

Eu acho que fiz disso um jogo pra jogar seu jogo
E me deixei chorar
Eu me enterrei vivo por dentro
Para poder te expulsar
E deixar você ir embora por um longo tempo.


[Buried Myself Alive - The Used]

Can you dance?


A tarde era morna quando Sue apareceu no estúdio como sempre costumara fazer nos ultimos dias. Afastou os cabelos negros dos olhos castanhos e agachou próxima a porta. A sala espelhada abrigava as garotas que, ainda sentadas no chão, amarravam as sapatilhas de ponta. Pela fresta que se abria, pôde ver a imagem dela sentada a um canto, os braços esticados e as feições doces de sempre. Mel aquecia-se para começar.
Pudera Sue, por meses, tomar coragem e finalmente deixar as palavras falarem por seu coração, mas algo lhe impedia. Talvez fosse a graciosidade de Mel que lhe tirava o fôlego. Ou talvez fosse apenas a falta de palavras para expressar o que sentia. Desejou escrever-lhe algo, como sempre fizera, mas de que adiantaria?
A música começou, doce e sinuousa. Sue apertou os olhos para ver melhor quando Mel começara a dançar. Como pudera se apaixonar por ela? Tão linda bailarina cheia e graciosidade. Parecia levitar enquanto dançava ao som de... Mozart, talvez? Sue não conhecia.
Contemplou-lhe o olhar triste que habitava suas feições. Sempre o encontrou ali. Constante. Surpreendera-se em ver que uma lágrima escorria pela face de Mel quando parara de dançar e rumava em direção a porta. Uma voz irritada gritou o seu nome, mas Mel ignorou. Abrira a porta e seu olhar recaiu sobre a figura agachada ali. Sue estendeu o corpo e tropeçou nos pés enquanto realizava tal ato. O rosto corou instantaneamente. Quisera dizer algo, entretanto, Mel não lhe dera tempo. Passou direto pela figura que acabara de encontrar e rumou em direção a saída do estúdio.
Sue assanhou os cabelos curtos enquanto as garotas da sala fitavam a porta. Desistira de entender se observavam-lhe ou se esperavam a volta de Mel. Assim, tomou o mesmo caminho que a bailarina fugitiva. Esperava encontrá-la na saída, mas com um suspiro decepcionado, desceu as ladeiras da cidade sem vê-la. Desejou estar com Mel naquele momento, mesmo que fosse para deixá-la chorar em seu ombro e nada falar.



"Escrito apenas pelo cansaço de repetir as mesmas palvras e de sentir as mesmas dores com intensidades similares. Querer mudar é errado?"

terça-feira, 6 de dezembro de 2011



Enroscado na cama, estava o corpo magro de Peggy. As paredes manchadas abrigavam o mofo de séculos sem cuidado. A TV chiava tristemente e os lençóis encardidos cheiravam a naftalina. Satisfez-se com a aparência do lugar; combinava com o interior de seu coração, necrosado pelos anos de dor contínua.

Já não recordava como havia chegado ali. Preferiu manter-se longe, numa distância segura do mundo; envolta do irreal que lhe abrigava. Os dias já não eram mais contados, as horas corriam as pressas sem Peggy se dar conta. Não havia relógios no quarto. O tic tac assombroso das engrenagens do tempo não lhe atormentava. Apenas o barulho do silêncio e uma única voz que ecoava em sua cabeça confusa:

- Você está sozinha.

Desistira de decodificar de onde viera tal voz, que pronunciava tal venenosa afirmação com tanta clareza. Não estaria ela sozinha por ter optado estar? Manter-se afastada dos olhares de pena e das palavras vazias das pessoas não lhe trouxera a calmaria de sua própria solidão?

As noites em claro lhe contemplaram com olheiras. Os cachos desgrenhados já não eram tão bonitos. Não lembrava qual fora a ultima vez que ingerira comida. Alimentara-se nos últimos meses de nicotina e doses alarmantes de álcool. As seringas espalhadas pelo chão relatavam que Peggy drogara-se minutos antes. Questionava-se porque ainda não morrera.

Pouco se permitia sorrir e chorar havia se tornado momentos de pura raridade. Peggy perdeu-se tentando se encontrar. E na tentativa se encontrar, deixou esvair o que construiu para ser. Para si. Assim, conformou-se. Estagnou-se a permanecer sem identidade, rogando para que um dia, tudo viesse a mudar.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011


"Você foi a esperança nos meus dias de solidão,a angústia dos meus instantes de dúvida, a certeza nos momentos de fé"

(Paulo Coelho)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011


"Today the cold wind tore into my heart.

My eyes became more teary.
The memories in my mind fade a little more.


Everything seems just a little more sad."
YOU MAKE ME FEEL BAD.
Abandonada apenas com reflexos de vagas lembranças eu estava. A muito tempo, não permitia deixar que elas tomassem e invadissem o espaço seguro que tanto lutei para construir nas ultimas semanas. Tentei inutilmente afastar de mim as fontes que me devolviam sem pudor tamanho agravante dos problemas que me habitavam, mas a necessidade de sentir a presença de tal fonte me tornou fraca.

O sol já se despedia e deixava-se cair por trás das curvas montanhosas do horizonte. Pelas persianas da janela, adentrava seus ultimos raios que quebravam a penumbra instalada ali. Sobre a mesa, a cera da vela derretia conforme a chama lhe tocava. Sem lágrimas. O nó na garganta não estava atado. No peito, o coração pulsava e contorcia-se. O impulso de arrancá-lo sobreveio-me incontáveis vezes. Implorei para que minha cabeça assumisse o controle novamente. Perguntei-me em seguida se meu coração não cometeu o ato deplorável de persuadir minha cabeça a agir conforme ele desejava. Um complô milimetricamente planejado contra a minha sanidade mental.

Quando a escuridão se tornou maioria no cômodo, percebi o quão incorreta estava em permitir-me recordar tais acontecimentos. A sensação desagradável de perder o controle atingiu-me como um sopro. Meu eixo foi arrancado a força. A chama se apagou assim que sua fonte de vida derreteu por completo. Eu, completamente perdida no que estava instalado em mim, recolhi-me a um canto e permaneci ali, questionando apenas até quando deixaria aquilo me acontecer.

Busquei refúgio nas drogas que me foram receitadas. Arranquei forças no desejo intimo de abandonar aquele passado obscuro e repleto de complexidade. Acenei para situação  em sinal de despedida, mesmo sabendo que ela iria retornar. Implorei para que não fosse tão cedo.  

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Estranho estar no eixo. Ainda não sei conviver bem com a felicidade na qual fui contemplada.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Le Suicidal Feeling - Parte 5


Era manhã quando levantei com a indisposíção entranhada no corpo. Havia sido uma noite longa. A cama parecia lutar com o meu sono e travei incontáveis batalhas com os lençois para finalmente fechar os olhos e deixar que os sonhos me carregassem para longe dali. Enquanto eu dormia, o coração batia inquieto no peito.

A manhã esgueirou-se pelo céu ainda nublado de outono. Nesse dia, alguns raios de sol pediram passagem por entre as nuvens para atingir as janelas do meu quarto e banhou-me com um calor fraco. Peguei o celular e consultei a hora. O relógio marcava 7:30. Respirei fundo a ponto de quase rasgar os pulmões e me desvencilhei das cobertas que prendiam o meu corpo. Ainda sentia o efeito das doses de alcool que bebi na noite passada. Evitei encarar-me no espelho.

A higiene matinal foi feita automaticamente. Meu corpo agia sozinho enquanto os meus pensamentos rumavam de encontro a mesma imagem que vinha me assombrando durante as ultimas semanas que se seguiram. O nó foi atado em minha garganta, mas dessa vez eu não me permiti chorar. Deveras o tempo que escorreu pelas minhas mãos não podia ser disperdiçado. Havia tanta vida lá fora, por que eu passei a resumir a minha entre as quatro paredes do meu quarto?

Desci as escadas, um pé após outro, e decidi sair para contemplar-me com uma vaga caminhada matinal. A brisa fria acariciou meu corpo enquanto os finos raios solares tocaram-me numa saudação de boas vindas para a vida. As ruas, já habitadas pelas habituais pessoas que pulavam da cama assim que o sol aparecia, não estava deserta. Virei na esquina onde sabia ter uma padaria. Necessitava alimentar-me.

O lugar era aconchegante quando cheguei lá. Há muito tempo não me permitia ir ali e tomar um café sem a preocupação com os ponteiros do relógio que não estavam ao meu favor. Fui nas prateleiras a fim de apanhar algumas bolachas para acompanhar meu café.

Foi quando eu a vi.

Me perguntei se a conhecia até me dar conta de que era uma desconhecida. Os cabelos loiros e curtos estavam presos parcialmente. Estava submersa na dúvida de levar bolachas integral ou tracional. Enquanto isso, eu me rendia a observá-la por trás dos óculos escuros que me ocultavam as olheiras. Fingi apanhar algumas caixas de biscoito e o olhar dela se arrastou até mim. Me perdi por segundos no verde de sua íris, até seu corpo passar por mim e eu a ver indo embora. Meu olhar a seguiu até a saída da padaria.

Um sorriso esgueirou-se em meus lábios e eu já havia desistido de tomar o café. Paguei pelas bolachas, pedi um Cappucicno e rumei de volta para casa, ainda vagando as ruas com o olhar no intuito de encontrá-la. Voltei pra casa com o desejo intimo de reencontrá-la.

Isso não tardou a acontecer.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011


E a história se repetiu. Ela estava tão cansada. Cansada de sentir a mesma coisa, contemplar as mesmas
cicatrizes, ver a mesma imagem refletida no espelho e sentir o mesmo gosto das lágrimas que descansavam em seus lábios após escorrer pela sua face.

O ambiente era o mesmo. Preferia deixar-se na escuridão de seu quarto, onde seus olhos mal conseguiam distinguir os objetos que ali existiam. O único ruído que era ouvido vinha do relógio, quando os segundos se arrastavam noite adentro. A melodia triste ainda tocava baixinho enquanto ela chorava após ferir-se. Parecia estar viciada em cometer tal crime contra si.

Eram sempre as mesmas palavras: lembranças, dor, saudade, tristeza... Tantas vezes repetidas para diferentes pessoas. Nenhuma delas parecia compreender o significado delas e no quanto afetada ela estava por tais palavras fazerem parte do seu repertório. Perguntou-se se ela mesma tinha permitido a adição delas.

Estava cansada de não conseguir manter-se no eixo. Cansada de sentir falta da presença das pessoas erradas e de sofrer por não estar perto das pessoas certas. Cansada de olhar as mesmas fotográfias incontáveis vezes apenas para sentir-se viva. Agarrar-se ao passado apenas para não ter de olhar pra frente e se dar conta de que seus planos não saíram conforme ela queria.

Já não sabia como esconder suas marcas. Já implorava intimamente que as pessoas não reparassem na dor gravada em seus braços e na tentativa de fuga estampada em seu pulso. Quantas vezes teria de cobrir as olheiras que se instalaram ali deveras o anseio de adormecer? Adormecer e sonhar. Adormecer e não sonhar. Adormecer para não acordar nunca mais.

O que mais lhe cansava a mente era a ausência momentânea de sua agonia. Estranhava estar bem e questionava o que tinha lhe causado tamanha satisfação interior. As vezes, conviver com os poucos momentos de plenitude que lhe era cedido parecia ser algo de grande dificuldade.

Sua vida parecia um grande teatro. Seu mundo parecia se alto destruir com ela dentro. Suas máscaras já não lhe serviam no rosto e a alegria havia esquecido o endereço do seu coração. Mesmo assim, permaneceu ali. Estava cansada de lutar, mas preferiu não desistir de si.




quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Le Suicidal Feeling - Parte 4


Já fazia três dias de chuva constante e minha cabeça exibia o cansaço de lembrar a imagem dela. Não conseguia assimilar a ausência repentina de sua companhia. Ou o modo como ela passou a me evitar no trabalho. Nossos olhares já não se cruzavam mais. Suas palavras já não eram dirigidas para mim e o essencial para ser dito era atirado aos meus pés. Parecia ironia, mas em minha casa, ainda havia vestigios de sua passagem em minha vida.

Percorri cada um dos comodos mais uma vez, sentindo as lembranças invadirem-me a cabeça e o passado sussurrar em meu ouvido o quanto eu sentia falta do que a ele pertencia. Evitava o máximo possível deixar com que as recordações me habitassem por mais de cinco minutos, mesmo não obtendo sucesso algum em tal feito.

Acendi um cigarro depois de juras feitas para mim mesma de nunca mais fumar. A penumbra habitava o cômodo da sala. Preferi mantê-la daquela forma. Me sentia melhor quando a escuridão me fazia companhia. Sentei no chão, encostada na parede fria, e traguei, deixando a nicotina envenenar o meu intimo como antes. Guardei uma foto nossa dentro de um livro para não ter que contemplá-la sempre. Só quando a vontade surgisse. Os pertences dela foram escondidos no intimo do meu armário. Preferi mantê-la viva ali na esperança de seu retorno.

Enquanto terminava o cigarro, rendi-me a fitar o telefone na esperança que ela ouvisse meus pensamentos a longa distância e me ligasse. Percebi logo em seguida que passei a duas semanas fazendo isso. Observando o telefone e esperando ver o nome dela no visor. Ou então me contendo para não telefoná-la só para ouvir a voz rouca que tanto me fascinava.

Não sabia mais lidar com a sua ausência. Precisava dela e do seu acalento. A pergunta era se eu a teria de volta.

terça-feira, 25 de outubro de 2011


"Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. Me dê a coragem de considerar esse vazio como uma plenitude. Faça com que eu seja a Tua amante humilde, entrelaçada a Ti em êxtase. Faça com que eu possa falar com este vazio tremendo e receber como resposta o amor materno que nutre e embala. Faça com que eu tenha a coragem de Te amar, sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo. Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo. Receba em teus braços meu pecado de pensar."

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Slow Life


O dia se espreguiçou no horizonte, anuciando que já amanhecera. Ela abriu uma fresta das cortinas para ver se valeria a pena abandonar a segurança de seu quarto para render-se ao mundo lá fora. As ondas do mar choravam quando atingiam a costa, os pássaros piavam seu canto matinal enquanto a brisa morna balançava a folhagem dos coqueiros. Tudo parecia bem.

Arrastou-se até a cozinha e contemplou a mesa vazia. O resto do jantar da noite anterior ainda jazia sobre ela. Resolveu apenas alimentar-me com torrada e frutas frescas, aquelas que trouxe antes de buscar abrigo naquele chalé à beira mar com o intuito de desfrutar de sua própria companhia. Parecia a mais apropriada na situação  em que se encontrava. 

Vestiu o moletom largo e surrado, nunca conseguiu livrar-se dele, por cima da camisola rendada e encaminhou-se para o lado de fora do chalé. Assim que abriu a porta, o sol sorriu pra ela. Despejou sobre seu corpo um calor que já não sentia a muito tempo. Sua luz quase cegou-lhe ao contemplá-lo. Ela não se importou.

Segurando as torradas e as frutas enroladas numa toalha, deu alguns passos até seus pés afundarem na areia branca da praia e o vento marinho lhe atingir a face. Sentou-se ali. Diante dos seus olhos, a tamanha magnetude do oceano. Buscou o fim do horizonte, até onde sua visão pôde ir e se sentiu minuscula diante de tanta vastidão.

Ali, naquela praia deserta, os problemas não a encontraram. Sua dor adormecera. Suas lembranças não mais a assombravam. Sua presença agora era prazerosa pra ela mesma. Comeu seu café da manhã. Permaneceu a manhã inteira ali, desfrutando de sua plenitude.

domingo, 16 de outubro de 2011

Naquela manhã, ela levantou com o sentimento de que deveria permanecer ali, imersa em sua própria solidão. Já não suportava mais tentar sorrir quando sua alma era assassinada pela dor ambientada nela.

A vida carregou-a pelos punhos, a pulso. Ela, sem forças para lutar contra aquilo, apenas aceitou de mau grado a única opção imposta a ela. Seguiu em frente, representando aquele falso teatro de menina crescida enquanto seu mundo se alto destruia a cada segundo. Com ela dentro.

Caminhou. Foi de encontro a sua rotina cansativa, onde expressões de uma falso bem estar foram postas em seu rosto para que tudo parecesse normal. Até quanto tempo ela suportaria? Evitou pensar.

Decidiu fazer daquele ser sua nova pessoa. Desejou intimamente refugiar-se por trás daquela personalidade forte que era temporariamente ela. Tentou. Fracassou. Assim que se viu perdida, fugiu. Buscou abrigo naquele cubiculo frio, onde a única companhia que possuia era a dela mesma, assombrada por pensamentos que dilaceravam sua sanidade.

Sua máscara caiu junto com as lágrimas que conteve a tanto custo durante o dia. Naquele momento, estava a mercê de seu próprio sofrimento. Não conseguiu retornar. Desaprendeu a sorrir. Permaneceu ali.

Sozinha.

Amy diz que está completamente sozinha
Diz que o mundo nem ao menos conhece
Sobre a dor que ela esconde por dentro
Diz que a felicidade é só uma mentira

O cheiro das rosas ela joga fora
Só sussurro, não emite som
Não quero que o mundo conheça a verdade
Você tem sido arrasada e abusada... por você.
 
(Amy Says - Flyleaf)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011


Nada me parecia suficiente naquele instante. Lágrimas já não eram mais choradas. No peito, apenas a sensação de que algo faltava. Os olhos tristes e vermelhos fitavam o teto, enquanto os braços pendiam ao lado do corpo mórbido que habitava a cama. Seria meu esse corpo ainda?

O nó foi atado em minha garganta e eu não sabia se continuava viva. As fugas premeditadas de minha própria dor já não surtiam tanto efeito quanto antes. Meus pensamentos eram convertidos em lembranças tristes, numa saudade que embriagava-me e numa solidão que me envenenava a cada suspiro. 

Na ansia de me encontrar, me perdi. E no desejo de sentir-me viva, sangrei. O coração, que antes me pertencia, pulsava rápido e se chocava contra o peito ossudo do meu corpo. Enquanto o liquido vermelho vivo gotejava nos lençois encardidos, a culpa esbofeteou minha face. Acolhi-me no meu leito tortuoso e busquei numa falsa esperança razões para continuar ali.

De repente, aquele cheiro invadiu minhas narinas. Era puro, reconfortante. Como um chamado para a redenção. Debaixo do travesseiro, puxei a causadora de tamanho rebuliço em minha alma. Aquela camisa. E enquanto a imagem daquele indíviduo perambulava em minha mente, todo o tormento foi traduzido em lágrimas amargas que descansaram em meus lábios.

Busquei abrigo nas recordações de sua imagem e assim adormeci um pouco de minha agonia. Em meio ao silêncio moribundo ambientado no quarto, desejei ouvir aquela voz. Desejei estar em sua presença para que seu corpo me envolvesse num abraço que me devolveria a vida.

A escuridão ambientada ali não anunciou presença alguma. Estava eu apenas em minha companhia leviana. Esperando alguém que não iria entrar pela porta naquela noite. Talvez nunca fosse adentrar. Meu peito ardeu em desespero junto com as marcas gravadas por lâminas em meus braços. As lágrimas sessaram.
Dei-me por vencida e fechei os olhos, ainda sentindo aquele cheiro. Fugi covardemente de minha realidade e dos fantasmas que me assombravam, refugiando-me assim num sono profundo e sem sonhos. Sem forças, sem vida.




terça-feira, 4 de outubro de 2011

Much Like Falling


 Não sou má. Tampouco sádica. Não me ostento com meus feitos, porém, dificilmente tenho piedade quando uma alma se entrega a mim de bom grado.

Era um cenário tristonho. Algumas garrafas jaziam vazias no chão; ela havia bebido todo o seu conteúdo nas ultimas semanas na tentativa de anestesiar a sua dor. O quarto cheirava a mofo e o chão estava repleto de cinzas de cigarro. A penumbra era quebrada por um fino raio solar que adentrava pela fresta das janelas fechadas.

Debaixo de cobertas puídas, seu corpo estava.

Era magro. Os cabelos muito negros e curtos escondiam as feições que, um dia, já foram belas e apreciadas. Não havia mais lágrimas para serem choradas. No lugar delas, apenas o ardor na garganta e uma tonelada sobrecarregando o peito. Marcado no braço, o preço da solidão. Entre os dedos, estava preso o cigarro que ela havia desistido de fumar. 

Suas mãos foram em busca de mais uma droga, abandonando a fortaleza de lençois que protegiam seu corpo do ar gélido do cômodo. A respiração dela era dificultosa, o ar parecia queimar suas entranhas. A cada sopro de coragem, ela engolia um comprimido. Cada comprimido parecia comprimir seus anseios na mesma proporção que seu corpo agonizava. E em meio a isso, o pranto mudo interveio. Toda a dor voltou a escorrer através dos olhos castanhos dela. 

Estava eu prestes a agarrar sua mão e levá-la comigo, quando o feito foi intervido. Suspendido pela presença de um outro alguém que veio ao seu encontro, tomo-a nos braços enquanto ela sentia a vida esvairir-se do seu corpo debilitado. Parecia desejar vir ao meu encontro ao mesmo tempo que o se arrependia do crime que cometera contra si. Estava destruída por dentro.

Assim, doei a ela mais tempo. Tempo para se perder e se encontrar.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

 
Quando eu disse bom dia
eu estava mentindo
Eu estava realmente pensando em
como eu poderia parar de acordar

Ele apontou o quão egoísta
Seria eu me matar
Então eu continuo acordando

Parece com a sensação de estar caindo
Morrendo enquanto eu espero morrer
o medo de alguma coisa ou nada
Mentira solitária e vazia.


(Much Like Falling - Flyleaf)

quinta-feira, 22 de setembro de 2011


"Somente o calor dos teus braços, pra esquentar meu coração e tira-lo desse frio que se chama solidão."

domingo, 18 de setembro de 2011

Le Suicidal Feeling - Parte 3


E você quer três desejos:
Um para voar pelos céus
Um para nadar como peixes
E então um outro que você guarda para um dia de chuva.
Se sua amante levar o amor dela embora.

(Three Wishes - The Pierces)

Uma luz repentina esgueirou-se para dentro do cômodo, anunciando que já amanhecera. Abri meus olhos lentamente, tentando me acostumar com a presença da claridade. Enquanto o  vento acariciava as cortinas do quarto, que dançavam ao seu toque, despertei meu corpo com uma breve espreguiçada e tateei a cama em busca do corpo dela.

Do meu lado, jazia apenas um espaço vazio.

Chamei-a, mas não houve resposta. Meu corpo arrastou-se para fora da cama - ainda era possível sentir o cheiro dela empregnado em mim - e explorei minha casa em sua busca. Gritei seu nome incontáveis vezes, acreditando que ela poderia se materializar em minha frente a qualquer instante e esboçar aquele sorriso que me tirava do eixo. 

A verdade foi jogada aos meus pés e eu me vi obrigada a apanhá-la. Ela havia partido. Abandonou minha casa, deixando-me sedenta por suas palavras de explicação. A manhã não parecia mais tão quente, agora era gélida. Pingos de chuva começaram a ser descarregados lá fora. Escorreguei lentamente pela parede e larguei meu corpo no chão frio, estava semi nua. Algumas lágrimas escaparam dos meus olhos e descansaram em meus lábios. Seu gosto era de solidão.

Lembranças da noite anterior me bombardearam e pude jurar ser capaz de sentir o toque das mãos dela em minha pele, inflamando cada poro do meu corpo. O gosto dos seus lábios ainda habitavam o interior da minha boca. Ansiei intimamente pela próxima vez que iria prová-lo. Conclui em seguida que não haveria um novamente. Sua ausência deixou o fato consumado.

O barulho repentino na porta me fez despertar de minhas recordações.

O cabelo dela estava encharcado devido a chuva lá fora. A porta foi fechada e sua voz rouca me saldou com um sonoro 'Bom dia!'. Ela me fitou longamente, esboçando um sorriso de canto. Carregava sacolas de um supermercado que havia próximo a minha casa. "Trouxe o café da manhã, tua despensa estava vazia e eu tive de ir comprar umas coisas!" Ela falava, enquanto rumava para cozinha. Levantei-me do chão e sequei as lágrimas discretamente. 

"Aconteceu alguma coisa?" Seu olhar pairou sobre mim e eu sorri. 
"Não! Eu... estou feliz por você estar aqui!" respondi. Ela me ofereceu um sorriso e começamos a preparar o café da manhã, trocando beijos, abraços, carinhos e confissões. A história foi iniciada.

sábado, 10 de setembro de 2011

Bring me to life



“Tudo havia ficado pra trás. E pra que? Para aventurar-me num corredor escuro sem saber se eu veria a luz no final dele. Meu único desejo era provar sensações sentidas à um tempo longínquo e que eu sentia falta.”

Levantar foi um ato de extrema dificuldade naquela madrugada. Não havia acordado, tampouco conseguido dormir. Preferi permanecer ali, imóvel e imersa em sensações quase dolorosas, porém, que me reviveram. Aquela sensação, que há tanto tempo não me habitava foi convidada a retornar. Não sabia ao certo se eu desejava desfrutar de sua companhia, apenas a acolhi.

As tão conhecidas lágrimas ressurgiram após tanto tempo de dolorida ausência. Busquei o número dele e liguei. Amparei-me no conforto de sua voz, aquela que me oferecia razão para permanecer no lugar. Estava tão fora de eixo. Conversamos sobre saudade e eu senti uma imensa vontade de perder-me em seu abraço reconfortante. Poderia ter passado o resto do meu dia em sua presença distante, mas o tempo nos impediu.

Os segundos viraram minutos. Os minutos viraram horas. As horas foram sendo engolidas pelo tempo e eu não receava em perdê-lo ali. Já não receava mais nada desde a minha decisão. Rendi-me apenas a aguardar a escuridão da noite invadir meu quarto e se misturar com o negrume instalado em meu interior. Desejava explorar meu íntimo. Provar cada emoção e afogar-me na intensidade de cada uma delas.

Aguardei ansiosa pelo cansaço, sentindo-o possuir meu corpo lentamente conforme minhas pálpebras pesavam. Aos poucos, fui apanhada pelo sono. Segundos antes disso, questionei-me se desejava acordar na manhã seguinte ou permanecer adormecida ali por toda a eternidade.




nota da autora: sabe quando você precisa muito fazer uma coisa para acalentar a si mesmo e consegue? finalmente.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Le Suicidal Feeling - Parte 2


"Preciso ir agora." - eu disse.
"Eu te levo em casa!" - ela sugeriu.

Pestanejei por um momento antes de assentir, plena de que eu não conseguiria dirigir até minha casa após aquelas generosas doses de whisky. Um dos braços dela envolveu minha cintura. Com a outra, ela terminou o cigarro e arrancou as chaves da minha mão. Meus olhos fitavam um horizonte que já não era mais visível, meu olfato só era capaz de captar seu cheiro, minha mente estava totalmente entorpecida com a sua presença.

Dentro do carro, a escuridão era sepulcral, incomoda. Descancei a cabeça no banco enquanto ela colocava o cinto de segurança e dava partida. Enquanto ela dirigia, rendi-me apenas a observar as ruas desertas daquela noite abafada. Ocasionalmente, sentia o olhar dela rastejando sobre mim e encolhia-me no estofado do carro, levemente constrangida.  Em meio aos devaneios do caminho, deixei minha imaginação fluir  e deleitei-me com pensamentos desconexos e formidavelmente excitantes, onde a protagonista era ela.

O ar estava cálido quando paramos em frente a minha casa. O silêncio parecia um barulho assustador e irritante que martelava no íntimo do peito. Ou talvez as marteladas fossem do meu coração, traíndo-me? Relatando tudo o que eu sentia através de batidas fortes?

"tá entregue!" escutei-a dizer. Descemos do carro e ela me entregou a chave. "Como você vai voltar pra casa?" a curiosidade me impulsionou a perguntar. Ela me lançou um sorriso. Aquele sorriso quase perverso que abalava minha calmaria. "Eu me viro!" respondeu.

Ainda incapaz de articular muitas palavras devido a forma intensa que nos encaravamos, murmurei um boa noite quase mudo e um obrigado dito de forma breve. Deixei-a ali, parada enquanto lutava para chegar até a porta e refulgiar-me de sua presença dentro da segurança do meu lar. Minhas mãos tremiam convulsivamente enquanto eu tentava buscar a chave no interior de minha bolsa. Arrisquei um olhar na direção em que ela estava e senti meu coração estancar momentaneamente. Parada a alguns centimetros de mim, ela estava. Sua proximidade era tão absurda que podia distinguir cada sarda de sua face. Sem aviso prévio, suas mãos agarraram meu rosto e seus lábios rumaram de encontro aos meus sem encontrar resistência.

As chaves apareceram. A porta foi aberta. Eu estava em sua companhia. Nossas bocas permaneciam unidas. A noite parecia longa o suficiente para o que viria a acontecer.

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"Sei exatamente como é querer morrer, como machuca sorrir, como você tenta se encaixar mas não consegue, como você se fere por fora tentando matar o que tem por dentro."

Garota, Interrompida.

sábado, 20 de agosto de 2011

Le Suicidal Feeling - Parte 1



 Naquela manhã, acordei assombrada. Meu coração parecia pesar uma tonelada. O suor frio, a respiração entrecortada, arfante. Sentei na cama ainda tendo a clara visão da imagem dela, confundindo e consumindo meus pensamentos, sentada em minha frente. Entre um abraço e outro, seus lábios tocavam os meus. Ainda tinha a plena certeza de que podia sentir o gosto dela em minha boca e o seu calor em minha pele.

Joguei para o lado a onda de cobertores que me envolviam e cambaleei em direção ao banheiro. Entre um passo e outro, espreguiçava meu corpo e afagava meu cabelo. Questionava-me sobre a aparição de sua figura em meus sonhos.  Não me sentia normal.

Despi minha camisola de seda preta e liguei as torneiras de água quente do chuveiro. Evitei encarar meu próprio reflexo no banheiro. Tive receio de encontrar estampado no meu olhar o que eu receava sentir. Uma pilha de toalhas jazia sobre a estante. Apanhei algumas, coloquei-as num canto e me enfiei embaixo da água corrente, pretendendo ficar ali por horas.

Meu telefone bipou pela primeira vez.

Ensaboei meu corpo lentamente, sentindo o cheiro do sabonete liquido impregnar meu corpo. Enxagüei meu corpo, sentindo a espuma escorrer e a água levá-la embora. Apanhei uma das toalhas e enrolei-a em mim, tateando outra para secar meus cabelos.

Meu telefone bipou pela segunda vez.

Saiu da secretária eletrônica a voz dela. Meu coração parecia se recusar a voltar a bater e em um sobressalto corri para atendê-lo. “Você está atrasada e eu preciso de você aqui! Coisa muito urgente” Ela falou. Com a voz fraca, respondi: “Tudo bem, já estou indo!” Antes de desligar, ouvi ela dizer: “Vem logo!”. Ainda tentando recuperar a sanidade mental, rumei para o quarto. Abri meu closet em busca de alguma roupa para vestir. A escolha foi rápida e totalmente imprecisa.

Quando sai, o sol já despejava raios de luz na rua quase deserta, formando uma grinalda de cobre liquido. Enquanto dirigia, receava encarar o olhar dela. Tentava buscar forças no meu intimo para encontrá-la. Deixei-me perder em meus pensamentos, odiando a mim mesma por não conseguir controlá-lo. Já tinha esquecido da sensação que a insegurança produzia em mim.

Estacionei o carro e apanhei minha bolsa no banco de trás. Pude jurar que ouvi alguns dos funcionários me desejarem bom dia, mas não lembro de ter respondido. Parecia estar incapaz de articular alguma palavra. “Finalmente, né?” Eu ainda fitava meus próprios pés quando ouvi sua voz clara e rouca. Num som totalmente audível para que eu não pudesse fingir não ter ouvido.

Olhei para a entrada. Ela me esperava ali.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Quando Assim


A escuridão que foi instalada em meu quarto denunciou que já anoitecera. Nem havia me dado conta do tempo em que fiquei deitada ali, fitando o teto, imersa em pensamentos desconexos. Me sentia confusa naquele momento, amaldiçoando meu coração por mais uma peça que ele resolvera pregar em mim.

A foto dele ainda jazia sobre meu criado mudo, naquela moldura que eu havia comprado especialmente para abrigar aquela lembrança. Parecia-me o fim de uma bela história. Parecia que eu estava tentando afogar um sentimento que ainda existia no meu intimo.

Afogá-lo sem necessidade alguma.

Estranhamente, a necessidade de tê-lo ao meu lado não exigia mais delongas. A verdade é que eu o amava. O amava de uma forma intensa e pura. Minha alma entregue nas mãos dele, torcendo para que ele não a destruísse. O resultado disso seria o meu fim. O fim de planos, de expectativas, de segredos e confissões.

Então, por que tentar afogar algo que sustenta? Que me dá força para sempre seguir em frente? A escuridão sussurrou para mim que isso não duraria muito. As dúvidas e confusões vêm e vão, mas a certeza de se amar permanece sempre. Por mais que tentem ocultá-la.

Escutei as pedrinhas serem atiradas e baterem em minha janela. Era uma cena clichê, daquelas que a gente costuma presenciar nos filmes de sessão da tarde, mas aquele acontecimento me tirava o fôlego. E ao vê-lo aguardando em meu jardim, o sorriso doce decorando seu semblante apaixonado, as dúvidas eram esvaecidas de mim. Eu o tinha ao meu lado e nada mais importava.

terça-feira, 12 de abril de 2011


Solidão.
Sólida.
Solitária.
Só.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Courtesan - PARTE 7 (final)


- Madame Fournier, ele a aguarda no costumeiro quarto.
Depois de anos, eu aprendi que todos nós devemos aprender a lidar com determinadas mudanças. Após tantas reviravoltas, tomei ciência de que não se deve lutar contra elas, mas sim, aprender a se adaptar a tudo que elas lhe oferece. Não me demorei muito, rendi-me apenas a borrifar um pouco do melhor perfume que me foi dado e ir ao seu encontro. O Le Chat Noir parecia não ser mais o mesmo, os rostos haviam mudado e minha humilde presença não era mais humilde. Ao rondar pelos compridos corredores dali, as cortesãs passaram a abrir espaço para a minha passagem e mantinham-se cabisbaixas em sinal do mais profundo respeito.

Foram tempos difíceis e o Le Chat Noir foi entregue ao mais profundo luto. A pedido do próprio Dom Pietro, seu velório foi feito nos salões do cabaré. Seu corpo jazia no centro do estabelecimento e seu corpo era regado pelas garotas que choravam o ultimo adeus antes do enterro. Poupei-me do sofrimento de ter que ver aquele cenário fúnebre e permaneci no mais profundo silêncio, escondida na penumbra do salão. Senti a dor da perda se instalar em meu peito com uma rapidez quase mortal e me vi incapaz de suportá-la. Não fui capaz de evitar aquelas tão conhecidas lágrimas, deixei-as assumir o controle dos meus sentimentos e apoderar-se do meu ser.
Submergi nas minhas próprias lembranças, recordando momentos que passei ao lado de Dom Pietro e de tudo que ele foi capaz de me instruir. Arrisquei alguns sorrisos quando as lembranças eram boas, um sorriso sempre acompanhado com o choro da perda. A passos lentos, René rumou ao meu encontro e me honrou com sua companhia.. Segurava um lenço de ceda e o ofereceu a mim. Aceitei-o e sequei as lágrimas que insistiam em continuar caindo.
- Sinto muito. – a voz de René saiu rala e chorosa. Um sussurro quase inaudível.
- Todas nós sentimos muito. – arrisquei.
- Vai atender ao pedido dele? – René fitou-me longamente e aguardou a resposta ansiosa. Quebrei a ansiedade dela e respondi:
- Sim – abaixei a cabeça e sequei mais algumas lágrimas. – Eu vou assumir o Le Chat Noir.

O costumeiro quarto estava escuro. Um cigarro aceso descansava no cinzeiro e Alaster me aguardava sentado na cama. Suas feições haviam mudado um pouco, mas o tempo não conseguiu devorar a tamanha beleza do seu rosto.
- Madame Fournier – Alaster Chevalier ergueu-se e me ofereceu uma reverência.
- Alaster, você não precisa me tratar com tamanha cordialidade – sorri e notei o sorriso de canto que ele esboçava. – sou dona do Le Chat Noir, porém continuo sendo sua Juliete.
Ele me lançou um olhar derrotado e despiu o paletó enquanto eu deitava na cama e o aguardava calmamente. Foram tantos momentos esplêndidos que tive ao lado daquele homem que eu era incapaz de negar o quanto o amava. O quanto necessitava dele.
Confesso o quão duro foi vê-lo naquela cerimônia de casamento e permanecer no mais profundo silêncio. Apesar dos fatos, nada pareceu ter mudado tanto. Alaster continuava freqüentando o Le Chat Noir todas as noites, não se incomodava com os costumeiros comentários da alta sociedade. As vezes até parecia gostar da ideia.
Alaster me resgatou das lembranças que me possuíam e beijou-me os lábios. As mãos hábeis continuavam as mesmas, incendiavam minha pele com o mais simplório toque. Sem cerimônias, seu corpo se depositou sobre o meu e seu próximo ato foi me deixar sem nenhuma vestimenta.
A cada noite que passávamos juntos, eu lembrava que ele não era inteiramente meu. Pelo menos, Alaster não era meu perante toda a sociedade francesa. Porém, a sociedade francesa não era apta a compreender que não são simples votos ou falsos juramentos que fazem alguém pertencer a outro. Não, o amor vai além disso. Alaster poderia estar casado com outra, mas no fundo eu sabia que ele era meu porque seu coração me pertencia. E, bom, a reles jovem burguesa que se tornou prostituta e que agora dominava o império do Le Chat Noir. Eu, Juliete, Madame Fournier... pertencia inteiramente a ele. Só isso e mais nada.



nota da autora: Peço desculpas pela demora para atualizar o Armas Radioativas, meu novo blog anda tomando o dobro do meu tempo e me faltou um pouco de inspiração para finalizar Courtesan. Queria agradecer a ele por ter me dado tanta inspiração e a você, que acompanhou Courtesan até o fim.